O que faz um Psicanalista? Quem são eles? De quê se alimentam?
- Eduarda Paz

- 10 de jul.
- 3 min de leitura
Atualizado: 15 de out.

"Analistas são pessoas que aprenderam a exercer determinada arte e que paralelamente a isso podem ser pessoas como as outras."
Freud, 1937 (Análise finita e infinita)
Toda vez que conheço alguém novo eu me vejo com dificuldade de explicar com o quê eu trabalho. E não é falta de costume, eu recebo pacientes pra atendimento individual em Psicologia e Psicanálise desde 2015: já vão dez anos nesse fazer. A questão é que o que a Psicanálise propõe é algo tão diferente do que vivemos no cotidiano que chega a ser complicado de explicar pra alguém de fora. Freud chegou a comparar nosso trabalho com o de um arqueólogo; Lacan talvez preferisse comparar ao de um topólogo, mas esse é assunto pra outro dia, de tão minucioso que deve ser. Meu ponto é que a gente (eu) fica um tanto quanto bitolada das ideia quando mergulha muito a fundo em uma área específica, e parece difícil traduzir isso pra um leigo.
Antigamente eu dizia que era Psicóloga - por ser uma profissão que praticamente todo mundo conhece, eu usava como um atalho. O problema é que Psicanálise é muito diferente e distante da Psicologia! São formações diferentes, com premissas tão distintas que às vezes são opostas. Enquanto a Psicologia trabalha principalmente (ainda que não seja só isso) com a cognição, ou seja, com a consciencia: comportamentos visíveis, decisões conscientes e objetivas, buscando dar contorno ao caos das emoções e organizar as ideias, a Psicanalise caminha com prazer no sentido contrário! Então o que faz um psicanalista?
Escutamos sonhos, pensamentos que parecem não ter sentido, ideias fixas, medos irracionais, angústias, e inseguranças que muitas vezes a pessoa sabe não terem um motivo consistente. São todas criações psíquicas: criações da nossa mente. Em Psicanálise a gente entende que a única realidade que interessa é a realidade psíquica - e apesar do nome, ela tem um forte poder de influência em todas as áreas da vida de alguém. Muito além do mental.

Talvez tu já tenha ouvido falar de uma pessoa que passou anos buscando tratamento pra alguma dor e no fim das contas mandaram ela pro analista. Uma dor persistente, que não dava alteração em nenhum exame, a pessoa não tinha doença nenhuma e muito menos um diagnóstico... Eis que um médico ou médica no caminho dessa pessoa chega e diz "é psicológico!". E lá vai pessoa em busca de um analista - porque nessas horas não é qualquer profissional de Psicologia que está habilitado a tratar.
Quem é essa figura meio enigmática que consegue tratar o que ninguém mais conseguiu?
Um analista é alguém que acredita no inconsciente, e que trabalha com ele. Que entende que é preciso trabalhar com tudo aquilo que parece não fazer sentido, com o que nos escapa e ainda assim insiste, com o que esquecemos mas que interessa mais que o que podemos lembrar... Só assim pra entender e manejar um sintoma que aparece como uma dor enigmática, um aperto no peito, um choro que não passa, uma crise de pânico aparentemente aleatória ou um medo qualquer.
Talvez tu já tenha visto o meme que diz "fui dormir pra esquecer do problema e sonhei com ele🤡". Psicanalista é aquela pessoa que sabe que não tem escapatória pras coisas que se criam em nossa mente, elas sempre dão um jeito de aparecer de alguma forma: chamamos de lapsos, atos-falhos, chistes, sonhos. Todas são formações do inconsciente, junto das nossas mais íntimas "caraminholas" e "neuras", e das histórias que contamos pra nós mesmos ao longo da vida. Todas essas coisas são o material de trabalho de um analista, que fica mais do que satifeito de escutar as coisas que normalmente passam batido e parecem não ter importância alguma.
Pra nós tem, e como tem! Sabemos que elas dizem mais do que parecem dizer, e temos fome de saber mais sobre elas. No fim do dia um psicanalista é só uma pessoa normal, que resolveu estudar essas coisas todas e fazer disso seu trabalho: escutar pessoas com ética e curiosidade, por saber que colocar a fala em movimento pode produzir transformações. Trabalhamos com uma curiosidade faminta porque sabemos que falar movimenta as coisas, não é por acaso que o processo de análise ficou conhecido como talking cure: a cura pela fala.

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